sábado, 7 de novembro de 2009

Em terra de sucateiros, quem tem um PGR assim é rei...




Andre Kosters/ Lusa José Sócrates diz que está “triste” por o processo ‘Face Oculta’ envolver o amigo Armando Vara. O primeiro-ministro afirma que falavam regularmente.

José Sócrates diz que está “triste” por o processo ‘Face Oculta’ envolver o amigo Armando Vara. O primeiro-ministro afirma que falavam regularmente.
07 Novembro 2009 - 22h00

Investigação: PJ ouviu principais figuras do PS durante períodos eleitorais

José Sócrates escutado dezenas de vezes (ACTUALIZADA)

O universo da Comunicação Social esteve sempre presente nas dezenas de conversas entre Armando Vara e José Sócrates, escutadas pela Polícia Judiciária de Aveiro e anexas a certidões que se encontram desde Julho passado na Procuradoria Geral da República. O primeiro-ministro e o ‘vice’ do BCP falaram sobre as dívidas do empresário Joaquim Oliveira, da Global Notícias – que detém títulos como o Jornal de Notícias, o Diário de Notícias e a TSF –, bem como sobre a necessidade de encontrar uma solução para o ‘amigo Joaquim’. Uma das soluções abordadas foi a eventual entrada da Ongoing, do empresário Nuno Vasconcellos, no capital do grupo. Para as autoridades, estas conversas poderiam configurar o crime de tráfico de influências.

Outro assunto abordado nas inúmeras conversas escutadas e transcritas pelas autoridades foi a venda da TVI aos espanhóis da PRISA. Os temas ‘Manuela Moura Guedes/José Eduardo Moniz’ também foram falados, sendo evidente que o casal não era do agrado do primeiro-ministro José Sócrates.

Outras conversas foram ouvidas, transcritas e enviadas para a Procuradoria-Geral da República. Na altura, a Judiciária e o Ministério Público de Aveiro entenderam que, dada a gravidade das mesmas – e por envolverem o primeiro-ministro –, deviam ser comunicadas à hierarquia máxima do Ministério Público. Para que aquela decidisse o que fazer com a investigação.

Quase quatro meses passados, Pinto Monteiro ainda não decidiu o destino a dar à informação recolhida. Ao CM, confirmou apenas a chegada dos documentos, assumindo o seu gabinete que ainda não se sabia se havia ilícitos criminais e quem os iria investigar: 'A Procuradoria-Geral da República está a proceder à análise das nove certidões recebidas e, como já foi noticiado, foram pedidos elementos em falta que são essenciais para serem proferidas decisões, como seja saber se existem ilícitos e, nesse caso, onde devem ser investigados, abrir ou não inquéritos, arquivar ou mandar prosseguir investigações, apurar eventuais responsáveis', disse a assessora de imprensa de Pinto Monteiro ao CM.

O CM sabe ainda que as certidões não se limitam às conversas do primeiro-ministro. É já conhecido, neste momento, que as autoridades ouviram diversos elementos do Partido Socialista e que as mesmas escutas decorreram durante a preparação das três campanhas eleitorais que ocorreram neste ano.

José Sócrates falou ontem do processo e afirmou estar 'triste' com o facto de o caso envolver o seu 'amigo' Armando Vara. José Sócrates falava aos jornalistas no final do debate do Programa do Governo, na Assembleia da República, e confirmou que falava regularmente com Vara.

MAIS DADOS

ACUSADOS SAEM

José Sócrates diz que demite os gestores de empresas públicas que forem acusados no caso ‘Face Oculta’.

CERTIDÕES NA PGR

O procurador-geral tem as nove certidões há quase quatro meses na sua posse mas ainda não decidiu.

MINISTRO ASSEGURA

O ministro das Obras Públicas garante que as empresas têm 30 dias para fazer relatório.

O CHEFE DAS FINANÇAS E O COLABORADOR

Mário Pinho está indiciado por um crime de corrupção passiva para acto ilícito. Outra das medidas de coacção aplicadas pelo juiz de instrução foi a suspensão de funções na Repartição de Finanças de S. João da Madeira: não pode ainda sair do País ou contactar outros arguidos. No processo constam pelo menos 37 500 euros pagos por Godinho para arquivar um processo fiscal de 200 mil. Namércio Cunha, principal colaborador de Godinho, começou ontem a ser ouvido pelo juiz. A inquirição continua no dia 9.

PROCURADOR PEDIU TODO O PROCESSO AO MP DE AVEIRO

'Esclarecimentos adicionais.' É assim que Pinto Monteiro se refere ao pedido de informação enviado para o Ministério Público de Aveiro a propósito das certidões extraídas por suspeitas criminais que envolvem Armando Vara.Os 'esclarecimentos adicionais' implicaram o envio de todo o processo para a PGR. No entanto, há quatro meses que as cópias da investigação se encontram na PGR e Pinto Monteiro ainda não decidiu se estão em causa ilícitos criminais, quem os deve investigar e quais os crimes que as situações configuram.

O CM sabe que a posição da PGR está a causar mal-estar em vários sectores da Justiça. Tanto mais que Cândida Almeida, do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (a quem poderão ser enviadas as certidões para que os processos sejam investigados), já mostrou algumas dúvidas sobre o caso ‘Face Oculta’. A magistrada chegou mesmo a dizer, nesta semana, que só esperava não ter qualquer 'surpresa' no andamento da investigação.

REN: PENEDOS OUVIDOS A 17

O presidente da REN, José Penedos, e o filho, Paulo, estão notificados para interrogatórios no dia 17, no Tribunal de Aveiro. José Penedos já suspendeu funções na Rede Energética Nacional.

REFER: MAIS FUNCIONÁRIOS

José Valentim e Carlos Vasconcelos, dois quadros da Refer, vão ser ouvidos na segunda-feira. Ambos forneciam a Manuel Godinho informação privilegiada sobre os negócios da empresa.

VARA: EM AVEIRO NO DIA 18

Armando Vara só será ouvido no dia 18, um dia após José e Paulo Penedos. Durante a próxima semana, deverão ser ouvidos os familiares de Manuel Godinho e funcionários das empresas.

NOTA EDITORIAL

ONDE ESTÁ O CRIME?

Oprocurador-geral tem dúvidas sobre a natureza criminal dos factos que estão nas nove propostas de novos inquéritos a partir da ‘Face Oculta’. Isso resulta, claramente, de uma nota da PGR publicada nestas páginas.

O Direito não é uma ciência exacta e todas as dúvidas são admissíveis. Já menos se compreende - caso venha a confirmar-se em absoluto - que essas dúvidas só tenham sido suscitadas nos últimos dias e não ao longo dos mais de três meses que os documentos levaram estacionados na PGR.

É difícil perceber que essas dúvidas não pudessem ter sido dissipadas de imediato, depois de investigadores, magistrados e, porventura, o juiz de instrução terem convergido num acto que só pode ter lugar quando os factos evidenciam, de forma fundada, indícios da prática de um crime, desde logo como o de tráfico de influências. Será difícil perceber que este inexplicável compasso de espera venha a ser a causa da morte de um caso em que o regime joga a sua própria cara e dignidade.

Eduardo Dâmaso




Tânia Laranjo/ Manuela Teixeira


Correio da Manhã


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