terça-feira, 15 de julho de 2008

Luz para os cegos do neo-liberalismo


O País tem estado entregue à seita neo-liberal que domina o PS e o PSD e que inquinou também o PP de Paulo Portas.

A cegueira é tal entre estes iluminados que não vendo no neo-liberalismo uma das principais causas da ruína económica portuguesa, propõem ainda mais liberalismo e mais abertura da economia portuguesa ao exterior para resolver os problemas nacionais.

Não chegando o ultra-liberalismo socratino, no PSD António Borges e Pedro Passos Coelho propuseram aumentar a dose desta poção letal que em poucos anos fez desaparecer grande parte da nossa indústria, da agricultura e das pescas.

No dia em que o dogma neo-liberal viu a sua eficácia destrutiva denunciada ao mais alto nível com a intervenção do governo americano numa acção de semi-nacionalização para salvar da falência, duas gigantescas empresas, a Freddie Mac e a Fannie Mae, o Diário Económico publicou um excelente artigo de Joseph E. Stiglitz, Prémio Nóbel da Economia.

Dedicâmo-lo à seita neo-liberal, na qual se inclui José Sócrates e os demais comparsas, que estendo aos ultraliberais do PSD, do genial gestor António Borges ao brilhante Pedro Passos Coelho que ainda não mostrou saber fazer nada mas memorizou bem a cartilha ideológica dos seus correlegionários...




Será o fim do neo-liberalismo?

Existe uma grande disparidade entre os retornos sociais e os retornos privados. Se não forem alinhados, o sistema de mercado nunca poderá funcionar bem.

Joseph E. Stiglitz

O mundo não tem poupado o neo-liberalismo, essa amálgama de ideias que tem por base a noção fundamentalista de que os mercados se auto-corrigem, aplicam recursos de forma eficiente e servem devidamente os interesses do público. Foi este fundamentalismo de mercado que esteve na génese do “thatcherismo”, da “reaganomics” e do chamado “Consenso de Washington”, que privilegiou a privatização, a liberalização e os bancos centrais independentes focalizados apenas na inflação.

Os países em desenvolvimento têm-se digladiado entre si nos últimos 25 anos e o resultado dessa luta é hoje claro. Os países que adoptaram políticas neo-liberais são os grandes derrotados. E por duas razões. Primeiro, não souberam tirar partido do crescimento. Segundo, e quando cresceram de facto, os benefícios ficaram essencialmente nas mãos dos que ocupam o topo da pirâmide.

Por muito que os neo-liberais não queiram admiti-lo, a verdade é que a sua ideologia chumbou ainda noutro teste. Ninguém pode dizer que os mercados financeiros tenham feito um excelente trabalho no final da década de 90. Mas produziu, apesar de tudo, alguns efeitos positivos, como a descida dos custos de comunicação, que resultou numa maior integração da China e da Índia na economia global.

A má aplicação de recursos no sector imobiliário não ajuda a vislumbrar esses benefícios. As novas habitações construídas para famílias que não têm meios para as pagar resultou apenas em angústia e trauma para os milhões de famílias que tiveram de abandonar as suas casas. Em algumas comunidades, a actuação do governo tem-se limitado ao arresto de bens. Noutras, impera a consternação. E nem mesmo os chamados cidadãos modelo, aqueles que sempre se pautaram pela prudência no recurso ao crédito e pela liquidação das suas prestações, são poupados. Antes pelo contrário: os mercados desvalorizaram as suas casas muito acima das suas piores previsões.

Importa dizer que a “febre” do investimento imobiliário gerou alguns benefícios de curto prazo. Isto é, permitiu que algumas famílias americanas gozassem o seu estatuto de “proprietários” – durante escassos meses, é certo – e a possibilidade de viverem numa casa de maiores dimensões. O pior é o preço que as famílias e a economia mundial estão a pagar. Milhões de pessoas perderam a sua casa e poupanças, e as execuções hipotecárias precipitaram o abrandamento da economia global. O prognóstico é consensual: o abrandamento, além de generalizado, veio para ficar.

Mais: os mercados não nos prepararam para a escalada dos preços do petróleo e dos bens alimentares. Como é óbvio, nenhum destes sectores é um exemplo de economia de livre mercado, mas é precisamente aqui que reside parte da questão: a retórica do livre mercado tem sido usada selectivamente, isto é, adoptada quando serve interesses específicos e rejeitada quando não é esse o caso.

Uma das poucas virtudes da administração Bush será, talvez, o reduzido “fosso” entre a retórica e a realidade, comparando com os anos de governo de Ronald Reagan. A retórica de livre comércio de Reagan era acompanhada pela imposição de restrições ao comércio, entre as quais as conhecidas restrições “voluntárias” às exportações de veículos automóveis.

As políticas de Bush foram ainda piores, na medida em que se limitaram a servir os interesses da indústria militar norte-americana. A administração Bush só por uma vez foi mais “verde” – leia-se amiga do ambiente. Refiro-me aos subsídios à produção de etanol, cujo impacto ambiental permanece ambíguo. O mercado energético continua a ser alvo de distorções, introduzidas em parte pelo regime fiscal, mas se Bush tivesse levado por diante os seus planos, a situação seria hoje muito mais grave.

A combinação da retórica de mercado livre e de intervenção do governo foi nefasta para os países em desenvolvimento. A não intervenção no sector agrícola – orientação dada por organismos internacionais – expôs ainda mais os seus agricultores à devastadora competição dos EUA e da Europa. Os seus agricultores até seriam capazes de competir com americanos e europeus. O problema não é esse. O problema é não poderem competir com os subsídios atribuídos pelos EUA e pela UE. Não admira, por isso, que os investimentos agrícolas nos países em desenvolvimento tenham decrescido e agravado o “fosso” alimentar.

Os protagonistas deste erro, os que sugeriram esta orientação, nada têm a recear, uma vez que os custos serão suportados pelas populações desses mesmos países, em particular pelos mais pobres.

Os defensores do fundamentalismo de mercado querem agora que os erros do mercado sejam vistos como erros de governo. Um delegado do governo chinês colocou o dedo na ferida: os EUA deviam ter feito mais para ajudar os norte-americanos com rendimentos mais baixos a gerir melhor o problema do crédito hipotecário à habitação. Estou plenamente de acordo, mas isso não altera os factos: os bancos norte-americanos geriram especialmente mal o risco e essa má gestão tem consequências globais. Mas a injustiça é ainda maior quando se sabe que, apesar dos erros, os gestores dessas instituições saíram airosamente e com indemnizações milionárias.

Actualmente, existe uma grande disparidade entre os retornos sociais e os retornos privados. Se não forem alinhados, o sistema de mercado nunca poderá funcionar bem. O neo-liberalismo foi sempre uma doutrina política ao serviço de certos interesses e nunca se fundamentou em teorias económicas. Tal como, sabêmo-lo hoje, não é fundamentado em experiências históricas. Se aprendermos esta lição, talvez se faça luz ao fundo do túnel.

Tradução Ana Pina
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Joseph E. Stiglitz, Prémio Nobel da Economia

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